A caminho de Santiago

Dom Murilo S.R. Krieger, scj

Arcebispo de São Salvador da Bahia – Primaz do Brasil

 

Nesta época do ano – verão europeu –, muitos baianos se preparam para percorrer o caminho de Santiago. Situada no extremo noroeste da Espanha, a cidade de Santiago de Compostela tem uma longa história. Segundo a tradição, lá foi enterrado o apóstolo Tiago, após ter evangelizado a Espanha. Esse Tiago vem a ser o filho de Zebedeu e Salomé, irmão mais velho do evangelista João.

A partir do século VI e, principalmente, do século IX, Santiago de Compostela começou a receber visitantes de toda a Europa, que iam em peregrinação ao túmulo do famoso apóstolo. Para isso, enfrentavam um caminho marcado pela penitência e oração. Mais do que dirigir-se a um lugar concreto – Santiago –, o peregrino buscava fazer a mais difícil das viagens: aquela que o levaria ao interior de si mesmo, num vigoroso processo de conversão.

Muitos dos que se punham a caminho vestiam um manto, usavam chapéu de abas largas, para se protegerem do sol e da chuva, e levavam apenas uma mochila e um bastão. Poucos iam a cavalo: a maior parte ia pé, sem saber quando retornaria para suas casas. Animava-os o desejo de se confrontar com o Evangelho e de fazer uma experiência decisiva em suas vidas. Em determinados pontos do caminho, encontravam-se com peregrinos que até ali haviam trilhado outros percursos (há vários caminhos para Santiago…) e passavam, então, a ouvir histórias comoventes.

Santiago de Compostela continua exercendo, ainda hoje, um imenso fascínio sobre os que são sedentos de Deus. Milhares de peregrinos percorrem a cada ano as mesmas estradas, também eles guardando em seu coração mil histórias para contar.

Não poucos são aqueles que, transitando por algum desses famosos caminhos, buscam um sentido para sua vida – sentido que não encontraram ao longo das outras estradas que já haviam percorrido. Outros, cansaram-se de fugir de si mesmos e fazem uma nova tentativa de se conhecerem melhor.

A experiência de Santiago de Compostela pode ser resumida em três palavras: caminho, esperança e anúncio.

Caminho. Peregrinar significa partir, sair, deixar. Não é possível caminhar sem sair, sem se desapegar das coisas e da própria casa. Caminhar significa, também, procurar.

Esperança. Quantos estão imersos numa cultura de tristeza e morte! Quantos estão cansados e vivem envolvidos pelo pessimismo! A esperança tem um nome: Jesus Cristo.

Anúncio. Não há mensagem tão forte como a de quem, motivado pela fé, dedica sua vida ao irmão.

Nem todos têm condições de ir a Santiago de Compostela. Mas não é preciso fazer aquele percurso para alguém ter um coração de peregrino. O importante é não se iludir: a viagem ao interior do próprio coração continua sendo a mais difícil e exigente das viagens.