Matriz da paróquia Santíssimo Sacramento e Sant’Ana está completamente restaurada

“Eu fiquei maravilhado com o forro. Havia três camadas sobrepostas. O medalhão do forro era irreconhecível, não era possível decifrar”, afirma padre Abel

Após 11 anos fechada para requalificação e restauração, a matriz da paróquia Santíssimo Sacramento e Sant’Ana, localizada no bairro de Nazaré, foi reaberta. Para todos os lados que se olhe é possível perceber que o templo, erguido em 1717, possui grande importância na história de Salvador. No local estão os restos mortais de Maria Quitéria, heroína baiana na luta pela Independência, e de José Inácio Ribeiro de Abreu e Lima, o padre Roma, fuzilado há 200 anos durante a Revolução Republicana.

Para o pároco, padre José Abel Carvalho Pinheiro, o processo de restauração possibilitou, a cada dia, uma nova descoberta. “Eu fiquei maravilhado com o forro. Havia três camadas de tinta sobrepostas. O medalhão do forro era irreconhecível, não era possível decifrar. No baixo coro, por exemplo, tem uma frase que diz assim: ‘Aqui neste lugar dar-te-ei um pedaço de pão’. Essa frase é uma referência, quase que a identidade da Igreja, do nome: é a Igreja do Pão, é a Igreja do Cristo que se dá como alimento. No teto do batistério, outra surpresa: tem uma pintura do século 18 que foi redescoberta”, diz.

Construída no estilo barroco, a igreja foi remodelada para o estilo neoclássico ainda no século XIX. Da decoração barroca original restaram algumas imagens, os frontões das tribunas e o corrimão da escadaria que dá acesso ao primeiro pavimento. As pinturas que foram sendo redescobertas são assinadas por pintores renomados da época, como Franco Velasco, José Rodrigues Nunes e José da Costa Andrade.

Da fachada até a sacristia, todos os detalhes foram cuidados com muita atenção pela equipe de restauradores. “A igreja de Sant’Ana foi o maior desafio da minha vida profissional, porque é uma igreja extremamente grande e estava muito danificada. Quando eu entrei aqui pela primeira vez em 1996 tomei um susto, vendo os altares desabando, o forro caindo, os pombos voando, fazendo ninho sobre os altares, as pinturas rasgadas, as esculturas com mãos, dedos, partes dilaceradas. Foi um trabalho que eu envolvi 45 profissionais. 90% da igreja de Sant’Ana teve que ser toda desmontada para restaurar o estado físico das madeiras, reconstituindo cada detalhe”, afirma o restaurador e doutor em Artes Visuais, José Dirson Argolo.

Argolo afirma que ainda “existem surpresas precisando ser resgatadas, que são os azulejos fingidos e a pintura da cúpula e de sua volta, pois não houve verba suficiente para que este trabalho fosse realizado”, diz. Segundo ele, os azulejos fingidos são assim chamados, pois, na época da construção da igreja de Sant’Ana quando não se tinha dinheiro para trazer azulejos de Portugal, um pintor era chamado para, na pintura, imitar tais azulejos.

Padre José Abel apresentou a matriz aos jornalistas de veículos de comunicação da capital baiana

Quando foi fechada para o processo de restauração, a igreja estava literalmente desmoronando. Partes do forro e das cimalhas haviam despencado durante uma Missa, haviam vazamentos no telhado e fiação exposta nas escadas que dão acesso ao coro superior. Para que o trabalho pudesse ser iniciado e concluído, padre Abel formou uma comissão de restauro que desenvolveu um projeto junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) que, após aprovado, recebeu apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). No ano de 2009 o banco aportou R$ 2,7 milhões de reais para a primeira etapa da reforma. Já em 2014 foi assinado um novo contrato com o BNDES no valor de R$ 5,4 milhões, divididos em três parcelas para a conclusão da obra. A etapa final contou também com o apoio da Global Participações em Energia, que participou com 10% do valor total previsto.

A comunidade também arregaçou as mangas para conseguir mais recursos. Por meio de uma série de ações, como campanhas, jantares e rifas conseguiu reunir 1 milhão de reais. “A gente tem investimentos em curso, em restauração de templos católicos também, através do programa PAC Cidades Históricas. Nós temos buscando orientar os párocos e as irmandades para recuperar, na medida da capacidade que eles têm, pelo menos o telhado, dar algum tipo de manutenção, ou até que se possa ter um investimento maior. Temos procurado fazer uma articulação para captar recursos, a exemplo daqui, que foi um recurso de incentivo fiscal através da Lei Rouanet, então foi a Irmandade e o pároco que capitanearam um processo de captação de recursos que resultou num sucesso”, afirmou Bruno Tavares, superintendente do IPHAN na Bahia.

“É um sentimento de ação de graças. Gratidão que vem do fundo da alma de um padre que lutou com a sua comunidade por 11 anos, enfrentando os desafios, mas sempre com a consciência de que a obra é de Deus. Quando faltavam os recursos, eu dizia que a obra é de Deus e aí vinham as respostas positivas. Eu só tenho que agradecer a Deus, à comunidade e a todas as pessoas que foram sensíveis neste período de restauração”, afirma padre Abel.

Texto e fotos: Sara Gomes