A Sinodalidade como Exercício do Senso de Fé dos Batizados

Por Diácono Jorge Valois

Um dos fundamentos do exercício da sinodalidade na nossa Igreja está no chamado sensus fidei ou senso de fé dos batizados. De fato, como consequência do exercício do sacerdócio comum dos fiéis, cada batizado possui, por graça do Espírito Santo, um senso de fé (sensus fidei), que é capaz de unir a fé aos meios para vivê-la com coerência. Trata-se de reconhecer a fé da Igreja, naquilo em que ela não pode se enganar, já que é uma posição manifesta, a respeito da fé e da moral, do papa ao mais simples dos fiéis leigos e é, em vista disso, infalível, no ato de crer (Lumen Gentium, n. 12; Evangelii Gaudium, n. 119).

O  senso de fé é uma participação dos batizados no ministério profético de Cristo. No texto das conclusões da primeira sessão da fase universal do Sínodo, de outubro de 2023, chama-se o senso de fé como um instinto da verdade do Evangelho. De fato, é algo infundido pela graça batismal e, por isso, se torna algo “natural” ao ser cristão, já que o batismo concede uma nova natureza àquele que, mergulhado nas águas batismais,  se torna, em Cristo, uma nova criatura (2Cor 5, 17).

Já os Padres da Igreja se manifestaram sobre o sensus fidei, como expressão da verdade da fé. Tal sentido de fé, conforme Jerônimo e Vicente de Lérins, deve ser cristão, católico e eclesial. Também Santo Tomás de Aquino defendia um parentesco essencial  dos crentes com as coisas sobre as quais se devem discernir e que é um dom do Espírito Santo. Por sua vez, o Concílio de Trento reconhece um sentido universal eclesial, como salvaguarda e garantia da reta fé, frente aos erros (Denzinger, n. 1637).

De fato, a comum condição sagrada dos fiéis cristãos tem sua origem no sacramento batismal, que faz com que todos tenham a mesma dignidade, apesar da diversidade de vocações e ministérios. Essa dimensão batismal da Igreja a configura como Povo sacerdotal, consagrado pela unção do Espírito.

Assim, o sensus fidei é um carisma derivado da recepção do Espírito Santo no Batismo e na Confirmação, como expressão da presença da graça e da verdade de Jesus Cristo na Igreja, que consiste essencialmente na comunhão e comunidade de todos os crentes. Na medida em que o magistério (papa e bispos) não cria a fé, mas a preserva e transmite-a, deve respeitar o sentido de fé dos crentes. Entretanto, tendo em vista que os bispos possuem um mandato apostólico específico para a interpretação autêntica e para tomar a decisão última em questões de fé, possui a primazia sobre o sensus fidei dos batizados. Na realidade, o genuíno sensus fidei nunca poderá contradizer o ensino do magistério.

Dessa maneira, o bispo deve sempre deixar-se ser esclarecido pelo senso de fé dos batizados e também esclarecê-lo. Tal exercício tem, no atual caminho sinodal da Igreja, momento privilegiado para ser executado. Afinal, todos os batizados também foram iluminados com o dom da ciência e da sabedoria (Is 11,2 e 1Cor 12,8), provindos do Espírito, além do discernimento (1Cor 12,10) e também a eles é manifestado um sentido das verdades de fé e uma graça de rejeitar e discernir o que é contrário à mesma fé. Portanto, a sinodalidade quer realçar essa dimensão do sensus fidei, presente em todos os batizados, como uma forma de exercício do sacerdócio comum dos fiéis.