Há 5 anos, em uma entrevista concedida ao jornal católico francês La Croix, o Papa Francisco convidou as pessoas a se perguntarem como “um modelo demasiado ocidental de democracia foi exportado para países como o Iraque, onde já existia um governo forte, ou para a Líbia, onde existe uma estrutura tribal”. “Não podemos ir adiante sem levar em consideração estas culturas”, acrescentou o pontífice na entrevista.
Estas questões são sempre atuais, especialmente nos dias em que se tornou evidente o fracasso da tentativa americana e ocidental, no Afeganistão. A democracia pode ser exportada para estes países com armas? Ou a guerra se revela sempre uma aventura sem retorno? Olhando para a situação em que o Afeganistão se encontra hoje, mas também para a devastação a que o Iraque foi submetido, deveria ser reconhecida a prudência profética do “magistério da paz” dos últimos Pontífices. “Para fazer a paz, é preciso coragem, muito mais do que para fazer a guerra”. É preciso coragem para dizer sim ao encontro e não ao confronto; sim ao diálogo e não à violência; sim à negociação e não às hostilidades; sim ao respeito pelos acordos e não às provocações; sim à sinceridade e não à duplicidade. Tudo isto requer coragem, grande força de espírito”, disse o Papa Francisco em 2014.
As razões da paz
“As razões da paz são mais fortes do que qualquer cálculo de interesses particulares e do que qualquer confiança colocada no uso de armas”. Esta convicção, expressa em 1963 por João XXIII na sua Carta Encíclica “Pacem in Terris”, num momento de grande tensão internacional e reiterada pelo Papa Francisco na sua Encíclica “Fratelli tutti”, ressoa hoje forte diante do cenário afegão, à beira da guerra civil. As tribulações da nação afegã não podem e não devem resultar num novo conflito. Mesmo quando os ventos de guerra sopram, o futuro deve ser construído sobre a busca do diálogo e da paz. “Não é certamente com as bombas”, disse João Paulo II, em janeiro de 1992, ao Corpo diplomático credenciado junto à Santa Sé, “que o futuro de um país pode ser construído”. Quando estas palavras foram pronunciadas, o ano de 1991 tinha acabado de terminar no meio do estrondo das armas e imagens chocantes que mostravam populações martirizadas pela guerra na Iugoslávia.
Fazer prevalecer as razões da paz
Hoje, outras imagens angustiantes chegam do Afeganistão, onde o desespero de homens e mulheres agarrados na parte externa dos aviões que partem de Cabul, se soma ao desespero de mães e pais que deixam os seus filhos nas mãos de soldados e diplomatas estrangeiros, confiando-os ao desconhecido. Entre as sombras mais escuras e as angústias mais profundas, é possível discernir as luzes da esperança e as razões da paz. É possível, perguntou o Papa Francisco durante a vigília de oração pela paz na Síria em 2013, percorrer o caminho da paz e sair de uma espiral de dor e morte? “Sim, é possível para todos!”. “Cada um deve ser animado a olhar para as profundezas de sua consciência e ouvir a palavra que diz: deixe os seus interesses que atrofiam o coração, supere a indiferença em relação ao outro que torna o coração insensível, vença as suas razões de morte e se abra ao diálogo, à reconciliação: olhe para a dor de seu irmão e não acrescente mais dor, detenha a sua mão, reconstrua a harmonia que foi quebrada”, disse naquela ocasião.
Chega de guerra
Também o povo afegão, neste momento difícil, precisa reconstruir a harmonia, para levantar seu grito como Paulo VI na ONU em 1965: “Chega de guerra, chega de guerra! A paz, a paz deve guiar o destino dos povos e de toda a humanidade!”. As armas nunca são a solução. João Paulo II lembrou isso em sua mensagem ao presidente iraquiano Saddam Hussein em 1991: “Nenhum problema internacional pode ser resolvido de maneira adequada e digna recorrendo às armas”, escreveu ele. O pontífice polonês pediu ao presidente dos Estados Unidos para não poupar esforços para “evitar decisões irreversíveis”. As palavras do Papa Wojtyła não foram ouvidas. Em vez disso, prevaleceu a voz das armas e em 17 de janeiro de 1991 a operação “Tempestade no Deserto” começou. A opção militar acrescentou mais uma vez sofrimento e dor.
Viver em paz
O povo afegão hoje não pode ir adiante sem uma verdadeira paz que, como recordou Bento XVI em 2013, é um “dom de Deus” e também uma “obra humana”: “A realização da paz depende sobretudo do reconhecimento do ser, em Deus, uma única família humana”. Voltando o olhar para Cabul, o Papa Francisco, em 15 de agosto deste ano, fez um apelo no Angelus: “Cesse o estrondo das armas e que as soluções possam ser encontradas na mesa do diálogo. Só assim a população martirizada daquele país, homens, mulheres, idosos e crianças, poderá retornar às suas casas, viver em paz e segurança no pleno respeito recíproco”. Só assim o povo afegão poderá percorrer caminhos de paz, caminhos de fraternidade.
Fonte: Amedeo Lomonaco/Mariangela Jaguraba – Vatican News