Confira a homilia de Dom Murilo realizada durante a Missa da Vida Consagrada

Dom Murilo S.R. Krieger, scj

Arcebispo de São Salvador da Bahia e Primaz do Brasil

Ano da Vida Consagrada

Salvador, 31.03.15 – Santuário Nossa Senhora de Fátima

Leituras da Terça-feira da Semana Santa: Is 49,1-6 e Jo 13,21-33.36-38

 

 

  1. Estamos aqui na consciência de que um dia Deus – que segundo a descrição feita pelo profeta Isaías, chamou para uma missão seu “Servo” -, chamou também cada um de nós: O Senhor me chamou antes de eu nascer, desde o ventre de minha mãe ele tinha na mente o meu nome… Sobre mim e sobre você foi feita a mesma observação: Tu és o meu Servo.
  2. Estamos aqui para celebrar o dom do nosso chamado à vida consagrada. É o Papa Francisco que nos convida: “Juntos, demos graças ao Pai, que nos chamou para seguir Jesus na plena adesão ao seu Evangelho e no serviço da Igreja e derramou em nossos corações o Espírito Santo que nos dá alegria e nos faz dar testemunho ao mundo inteiro do seu amor e da sua misericórdia” (Carta Apostólica às Pessoas Consagradas, 21.11.14).
  3. Algumas convicções alimentam nossa espiritualidade e a animam. Na carta que nos dirigiu, o Papa Francisco lembrou algumas dessas convicções:
  • cada um de nossos Institutos tem uma rica história carismática; por isso, somos convidados neste ano a recordar os seus inícios e o seu desenvolvimento histórico. Lembra-nos o Papa Francisco: “Repassar a própria história é indispensável para manter viva a identidade e também robustecer a unidade da família e o sentido de pertença dos seus membros. (…) Narrar a própria história é louvar a Deus e agradecer-Lhe por todos os seus dons” (I – 1);
  • nossos Fundadores e Fundadoras “sentiram em si mesmos a compaixão que se apoderava de Jesus quando via as multidões como ovelhas extraviadas sem pastor”. Isso nos motivou, quando fizemos nossa profissão religiosa, a prometer a Jesus que ele seria nosso primeiro e único amor; sabíamos que somente assim poderíamos amar verdadeira e misericordiosamente cada pessoa que encontrássemos em nosso caminho (I – 2);
  • a esperança que nos anima “não se funda sobre números ou sobre as obras, mas sobre Aquele em quem pusemos a nossa confiança (cf. 2Tm 1,12) e para quem “nada é impossível” (Lc 1,37); anima-nos, também, a certeza de que o Espírito Santo quer que enfrentemos o futuro , “a fim de continuar a fazer, conosco, grandes coisas” (I – 3);
  • sabemos que somos chamados “a experimentar e mostrar que Deus é capaz de preencher o nosso coração e nos fazer felizes, sem necessidade de procurar em outro lugar a nossa felicidade” (II – 1);
  • nossa vida deve falar, “uma vida da qual transparece a alegria e a beleza de viver o Evangelho e seguir a Cristo” (id.);
  • não podemos ficar prisioneiros de nossos problemas. Esses se resolverão se procurarmos ajudar os outros a resolver os seus problemas, anunciando-lhes a Boa Nova. “Encontrareis a vida dando a vida, a esperança dando esperança, o amor amando” (II – 4).
  1. Nós, consagrados, somos chamados a deixar de lado nossos projetos pessoais para imitar Jesus Cristo, que foi um irmão universal. Com nossa vida, mesmo que silenciosa, mesmo que contemplativa, gritamos ao mundo que Deus nos basta, pois Ele é plenamente capaz de dar sentido à nossa vida. Só Deus merece ser amado por Ele mesmo.
  2. Temos consciência de que o valor de nossa vida não se mede por números, pela nossa fama ou eficácia; mede-se, sim, pela intensidade de nosso relacionamento com Deus. E como é importante termos consciência disso, pois continuaremos contribuindo com o dom de nossa vida para a glória de Deus e a salvação dos irmãos também quando ficarmos doentes ou incapacitados de trabalhar.
  3. A vida consagrada não é um bem somente para a Igreja, mas para toda a humanidade. E como a humanidade precisa desse bem! Nos consagrados e nas consagradas, Cristo continua a debruçar-se sobre doentes em hospitais; a cuidar de crianças em creches; a educar crianças, adolescentes e jovens em colégios; a visitar casas de pessoas necessitadas; a cuidar de centros de encontros; a trabalhar em paróquias; a atender bispos e padres; a assistir círculos bíblicos, pastorais e movimentos; a acolher peregrinos em albergues; a olhar com carinho para idosos em asilos; a cuidar de menores abandonados e de jovens dependentes de drogas; a evangelizar através de livros e de outros meios de comunicação… Em cada consagrado e consagrada, é Cristo que passa pelos caminhos do mundo.
  4. Se há uma diocese que deve louvar e agradecer o Senhor pelo dom da vida consagrada, essa diocese é a nossa. A presença de religiosos nesta Arquidiocese Primaz aqui desde 1549 foi essencial para que Jesus Cristo fosse conhecido e servido, amado e seguido. Milhares de homens e mulheres, vindos de diversos países, demonstraram sua disposição de ser aqui um sinal para todos – sinal do amor de Deus e do privilégio de alguém seguir o Seu Filho pelos votos de pobreza, castidade e obediência. S. José de Anchieta, a Bem-aventurada Lindalva e a Bem-aventurada Dulce dos Pobres são exaltados e admirados; na verdade, eles são exemplos de uma santidade escondida em conventos, nas periferias de nossas cidades, em mosteiros contemplativos e paróquias.
  5. Por tudo isso, que bom termos um ano para conhecer melhor a vida consagrada e promovê-la! Espero que, como primeiro resultado, cresçam em nossa Arquidiocese as vocações para essa vida, particularmente nas congregações que aqui atuam. Será uma humilde forma de retribuirmos à Igreja o bem que consagrados e consagradas já fizeram ou continuam fazendo aqui em tantos campos e necessidades.

Termino com duas observações: a primeira é do Papa Bento XVI – observação que foi retomada pelo Papa Francisco na Carta que nos enviou: “Vós, [consagrados e consagradas] não tendes apenas uma história gloriosa para recordar e narrar, mas uma grande história a construir! Olhai para o futuro, para o qual vos projeta o Espírito [Santo] a fim de realizar convosco ainda coisas maiores”. A segunda observação que lhes faço é, na verdade, um convite: tomem consciência de que é para cada um de nós que o Senhor faz a afirmação: Eu te farei luz das nações, para que minha salvação chegue até aos confins da terra (Is 49,6b).