Cardeal Dom Sergio da Rocha

Arcebispo de São Salvador da Bahia, Primaz do Brasil

A celebração dos 10 anos de pontificado do Papa Francisco tem suscitado inúmeros artigos, análises e publicações no mundo todo, pois o seu significado e implicações vão muito além da Igreja Católica. Os pronunciamentos, escritos e iniciativas corajosas de Francisco na promoção do diálogo, da fraternidade, da justiça e da paz, fazem dele uma das principais lideranças no atual cenário internacional marcado por tantos conflitos e dores.

Ao longo destes dez anos, muitos gestos pessoais de Francisco têm repercutido bastante na Igreja e no mundo, pelo significado religioso, ético ou político. Ele ensina não somente por aquilo que fala ou escreve, mas por seus gestos concretos. A simplicidade de Francisco interpela e comove. A escolha do seu nome, o modo como dirigiu sua primeira benção na praça de São Pedro, após ser eleito em 13 de março de 2013, a opção pela Casa Santa Marta para sua residência, já revelavam bem, desde o início, o seu jeito de ser Papa e os traços marcantes de seu pontificado.

A sua primeira viagem fora do Vaticano foi à ilha de Lampedusa, no sul da Itália, para abraçar, apoiar e consolar os imigrantes e refugiados, para rezar pelos que haviam morrido a bordo de embarcações precárias, e para ser solidário, chamando a atenção do mundo para a crise migratória. Na sua corajosa viagem ao Iraque, começando por Bagdá, o Papa “peregrino da paz”, “construtor de pontes e não de muros”, enfatizou o diálogo e a fraternidade como caminho de paz. Francisco tem demonstrado em inúmeras ocasiões o seu amor pelos pobres e fragilizados e sua busca incansável de justiça, solidariedade e paz.

O Brasil teve a alegria da sua visita, em 2013, no Rio de Janeiro e em Aparecida, na Jornada Mundial da Juventude, mas ele se fez presente na Amazônia, de modo afetuoso e solidário, sem ter pisado o seu chão, ao convocar um Sínodo Especial, realizado em 2019. A encíclica “Laudato Si”, publicada em 2015, continua a ser muito apreciada, contribuindo para o conhecimento das questões ecológicas e a corresponsabilidade no “cuidado da casa comum”.

Reformas de cunho pastoral e canônico têm sido empreendidas por ele, com muita dedicação e persistência. Dentre elas, estão a reforma da Cúria Romana e o caminho sinodal em curso, ampliando largamente a participação de toda a Igreja no Sínodo dos Bispos. Além disso, ele tem lutado incansavelmente pela superação de abusos praticados por clérigos, com medidas canônicas rigorosas. Outra marca do seu pontificado tem sido a valorização da Igreja e dos povos em países não devidamente apreciados na geopolítica mundial, ao nomear cardeais ou outras funções na Cúria.

Exemplo de persistência, Francisco não se deixa abater pelas críticas ou pelas limitações de saúde, visto frequentemente em cadeira de rodas. Ele continuará a encantar e a provocar, como aquele no qual inspirou-se para escolha do seu nome, Francisco de Assis.

*Artigo publicado no jornal Correio, em 27 de março de 2023.