Homilia de Dom Sergio da Rocha, Cardeal Arcebispo Primaz do Brasil, na Matriz Nossa Senhora da Conceição e São José, em Montes Claros (MG), em 03.01.2021
(Saudações)
“Senhor, eu cantarei eternamente o vosso amor” (Sl 88). Assim cantamos, nesta missa, com o salmista, louvando a Deus pela sua misericórdia eterna e pelo seu amor sempre fiel na nossa vida, na vida da Igreja e, hoje, de modo especial, pela ordenação episcopal de Dom Dorival.
A Palavra de Deus que acabamos de ouvir ilumina este momento de reflexão sobre a missão do bispo. A parábola que ouvimos faz pensar no bispo como trabalhador na vinha do Senhor, o que exige atitude de serviço generoso, de humildade e disponibilidade para a missão. Esta é a disposição manifestada pelo novo bispo ao escolher o seu lema episcopal belo e exigente: “Ide também vós para minha vinha (Mt 20,7). É motivo de louvor a Deus, de esperança e alegria, o bispo que se apresenta como servidor, como trabalhador humilde e disponível da vinha do Senhor, pois afirma a homilia ritual proposta para esta ocasião que “o Episcopado é um serviço e não uma honra; o Bispo deve distinguir-se mais pelo serviço prestado que pelas honrarias recebidas”. A simplicidade evangélica que tem sido testemunhada pelo Papa Francisco possa resplandecer sempre mais na vida do bispo e de toda a Igreja.
A parábola que ouvimos ressalta a generosidade e a gratuidade do amor de Deus na igual recompensa oferecida aos trabalhadores para a vinha, chamados nos diferentes horários do dia. Os critérios do Reino de Deus não seguem a lógica dos reinos deste mundo. O amor de Deus não se restringe aos limites estreitos da lógica farisaica da recompensa, pois é gratuidade, é graça. A Igreja é chamada a ser sinal do amor de Deus, como comunidade acolhedora, valorizando os “últimos”. Num mundo marcado por tantas situações de sofrimento, violência e morte, o bispo é chamado a ser portador da esperança, a ser mensageiro da paz e servidor da caridade, com especial solicitude para com os pobres, os enfermos e sofredores, especialmente neste tempo tão difícil da pandemia. Para tanto, deve “amar com amor de Pai e de irmão”, com o coração paterno e fraterno, “todos aqueles que Deus nos confiou”, especialmente os “últimos”, os que não são valorizados e amados no mundo.
O “Ide” da parábola dos vinhateiros faz pensar no “Ide” dirigido por Jesus aos seus discípulos, enviando-os a evangelizar, recordado na aclamação ao Evangelho. O envio missionário de Jesus se renova, hoje, entre nós, ecoando em nossos corações e no coração do novo bispo. A resposta ao “Ide” em missão conta agora também com o novo Bispo.
O mandato missionário deve ecoar sempre mais na vida da Igreja, em toda a parte, em Montes Claros ou em Salvador. A Igreja necessita de discípulos de Cristo que tenham coração missionário: bispos, presbíteros, diáconos, religiosos, leigos. A ordenação de Dom Dorival como bispo auxiliar da Arquidiocese de São Salvador da Bahia nos traz a esperança de poder compartilhar, com mais um irmão bispo, a missão evangelizadora da Igreja.
Caríssimo Dom Dorival, o Santíssimo Salvador lhe espera na Sé primacial do Brasil, no centro histórico, nas suas belas igrejas, nas periferias sofridas com a pobreza e a violência, nas comunidades do interior e da ilha. A Igreja primacial do Brasil, que em breve estará celebrando 470 anos, conta com o novo bispo auxiliar para continuar a evangelizar sempre mais e agradece profundamente a Igreja de Montes Claros pelo precioso dom ofertado a Salvador.
O “Ide também vós para a minha vinha” se dirige a toda a Igreja, segundo as diversas vocações e ministérios. O Bispo, com o coração missionário, ajuda a comunidade eclesial a responder “sim” e a valorizar o “sim” dos trabalhadores das diversas horas, a ser Igreja misericordiosa e servidora.
A Carta aos Efésios ressalta a unidade da Igreja na diversidade de dons e ministérios que procedem de “um só Senhor, uma só fé, um só batismo” (Ef 4,4). A diversidade de ministérios, dentre os quais está o ministério episcopal, tem em vista “edificar o corpo de Cristo” (Ef 4,12), conforme as palavras do Apóstolo. Necessitamos oferecer a todos a oportunidade de estar na vinha do Senhor, valorizando as diversas vocações e serviços. A parábola nos faz pensar no modo como os “últimos” são tratados, especialmente aqueles que chegam numa comunidade para dela participar e exercer diferentes funções pastorais, ou os que estão iniciando um caminho de conversão. Quem está há mais tempo merece o reconhecimento e a gratidão, mas é preciso acolher bem os que chegam e valorizar os que nela se encontram há menos tempo. Na comunidade eclesial deve haver lugar e trabalho para todos.
Na raiz de cada vocação e serviço eclesial está o Senhor que chama e envia em missão. O episcopado é dom inestimável da graça de Deus. É graça que supera nossos méritos e capacidades. Por isso, quem o recebe refaz a experiência do profeta Jeremias, recordada na Liturgia da Palavra, que se sentia pequeno e frágil diante da grandeza da missão profética. Porém, a certeza da presença amorosa de Deus anima e fortalece quem é enviado em missão: “Não tenhas medo, pois estou contigo” (Jr 1, 8), disse o Senhor a Jeremias, estendendo a mão e tocando a sua boca. “Não tenhas medo, pois estou contigo”, diz o Senhor a Dom Dorival. “Estará sempre com ele a minha mão”, diz o Senhor. “O meu braço poderoso há de ser a sua força. Minha verdade e meu amor estarão sempre com ele”, é a promessa feita a Davi, conforme o Salmo 88, que se cumpre também na vida daqueles que o Senhor unge e envia em missão.
O Espírito de Deus unge e anima o bispo enviado em missão, fecundando a ação evangelizadora da Igreja. Por isso, o rito da ordenação episcopal inicia-se com o belo hino ao Espírito Santo, Veni Creator Spiritus, e o novo bispo tem sua cabeça ungida com o santo óleo do Crisma. Para estar a serviço é preciso conservar sempre o coração de discípulo, continuamente disposto a aprender com o Mestre para poder ensinar. Sobre a cabeça do novo bispo, durante a prece de ordenação, é colocado aberto o Livro dos Evangelhos. O seu modo de pensar, de sentir e agir, sejam sempre iluminados pela Palavra de Deus, com a unção do Espírito Santo.
A missão evangelizadora é imensa! A participação do bispo nesta missão é grande. Caríssimo Dom Dorival, obrigado pelo seu “sim” generoso ao chamado para dirigir-se à porção da vinha do Senhor que está em Salvador. Tenha certeza do cumprimento fiel da palavra de Jesus: eis que eu estarei convosco todos os dias até o fim. Tal promessa se cumpre na sua vida, hoje, ao assumir o ministério episcopal. Não lhe faltará a graça de Deus. Tenha certeza também das orações, da amizade e do apoio fraterno de muitos irmãos e irmãs de Minas Gerais e da Bahia: bispos, padres, religiosos, diáconos, leigos e leigas, seus familiares e amigos. Em Salvador e na Bahia há muita gente de coração e braços abertos esperando a sua chegada, com alegria e rezando por sua vida e ministério. A Bahia de todos os santos, de Santa Dulce dos Pobres e da Beata Irmã Lindalva se alegra com mais um bispo de origem baiana. Esteja certo, acima de tudo, que o Senhor do Bonfim lhe espera em Salvador, de braços abertos. Interceda pelo novo bispo Nossa Senhora da Conceição, a Mãe da Igreja, venerada na Bahia como Nossa Senhora da Conceição da Praia, excelsa Padroeira do estado. Amém!
Louvado seja N. S. J.C.
Cardeal Dom Sergio da Rocha
Arcebispo de São Salvador da Bahia – Primaz do Brasil