
Sacerdote do clero da Arquidiocese de São Salvador da Bahia
Nunca podemos perder de vista que o ser cristão e o chamado a fazer parte da comunidade dos discípulos de Cristo, que é a Igreja, se constitui em uma verdadeira vocação. O apóstolo Paulo nos ensina que “Deus nos elegeu, antes da fundação do mundo, para que sejamos santos e irrepreensíveis, sob o seu olhar, no amor” (Ef 1,4). Nem todos serão chamados a fazer parte da Igreja, mas apenas aqueles a quem Deus elege. É uma vocação para ser um sinal de contradição (Lc 2,34) no meio do mundo, a ser sal (Mt 5,13) e luz (Mt 5,14). Aqueles que não fazem parte da Igreja serão “salgados” e “iluminados” pelos cristãos, que verão neles uma profecia viva de que Deus também os ama e quer que “todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Tm 2,4).
Assim, como comunidade de fé, como vocacionados por Cristo a fazer parte do seu povo santo, somos chamados a dar ao mundo um testemunho de comunhão. De fato, somos vocacionados à unidade e a experimentar que “não há mais judeu ou grego, escravo ou livre, mas todos nós somos um só em Jesus Cristo” (Gl 3,28). Portanto, a vocação à sinodalidade é, antes de tudo, a vocação à comunhão.
Sem comunhão não é possível experimentar a sinodalidade, porque ela implica um exercício concreto de escuta do outro, dos seus pensamentos e anseios, preocupações e desafios, sonhos e ideais. Dessa maneira, os instrumentos de exercício sinodal, como as assembleias de pastoral e os conselhos paroquiais, devem privilegiar essa escuta, que não se resume a uma mera enquete ou pesquisa para saber a opinião do outro. Por isso que ser sinodal é uma vocação, porque se trata de uma escuta no Espírito, ou seja, de uma escuta orante, para discernir aquilo que Deus está inspirando e suscitando no seio da comunidade.
A comunhão se dá também quando se superam os condicionamentos e as visões fechadas que trazemos dentro de nós e não somos capazes de estar abertos àquilo que Deus está inspirando por meio do outro, cuja opinião diferente é vista como uma ameaça e não como uma oportunidade para manifestar abertura à ação do Espírito, que vai além da nossa visão eclesial, mas “sopra onde quer” (Jo 3,8). De fato, o Espírito Santo nos faz sair dos nossos particularismos e conceitos pré-estabelecidos e que já trazemos petrificados dentro de nós, para nos fazer entrar em uma experiência espiritual mais autêntica e uma visão mais esclarecida a respeito da fé e da revelação de Deus.
Somos, assim, vocacionados ao discernimento. O discernir sempre implica uma avaliação e uma escolha, separando o joio do trigo (Mt 13,24-30). O exercício da sinodalidade nos faz perceber quanto joio ainda existe dentro de nós! Quantos conceitos e pensamentos que trazemos não são os inspirados por Deus e não correspondem à sua vontade, mas são apenas ideias que recebemos do mundo e que queremos adaptar e misturar com os valores do Evangelho. A escuta e o discernimento comunitário, próprios da experiência sinodal, bem como a palavra decisiva dos pastores da Igreja nos ajudarão na purificação desses conceitos e valores mundanos.
Mas também, a sinodalidade nos faz perceber quanto trigo também temos dentro de nós! Quanta semente boa plantada no terreno do nosso interior germinou e deu frutos! A partilha das próprias experiências e inspirações nos ajudam a reconhecer que os apelos interiores que sentimos podem, à luz da comunidade de fé e de seus pastores, ser moções genuínas que, de fato, são dadas por Deus.
Dessa maneira, o exercício sinodal é uma experiência que se revela como uma grande oportunidade de crescimento e amadurecimento na fé, porque vamos aprendendo a dar passos concretos na escuta, discernimento e execução da vontade de Deus para a nossa vida e para a Igreja. Essa é a nossa vocação como comunidade de fé: conhecer e compreender o projeto de salvação de Deus, para comunicá-lo ao mundo, vivendo na comunhão e superando os particularismos e exclusivismos que geram divisão no seio da comunidade eclesial.
Correspondamos a essa vocação dada por Deus de vivermos a nossa experiência eclesial na sinodalidade e agradeçamos ao Senhor por nos fazer participar do seu povo santo e conhecer a sua identidade e vontade, como nos recorda o profeta Baruc: “Ó Israel, felizes somos nós, porque nos é dado conhecer o que agrada a Deus”. (Br 4,4).



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