
Sacerdote do clero da Arquidiocese de São Salvador da Bahia
É fundamental entender a sinodalidade não apenas como um método de discernimento pastoral, mas como algo constitutivo da própria essência daquilo que é a Igreja. E, como tal, a sinodalidade é uma expressão da comunhão trinitária, já que tudo que se refere à essência da Igreja possui suas raízes na Santíssima Trindade. Dessa maneira, neste artigo, vamos entender de que maneira a sinodalidade é um reflexo da relação entre as pessoas divinas do Pai e do Filho.
A Igreja é chamada a ser no mundo sinal do amor do Pai pelo Filho. Assim como o Pai envia seu Filho ao mundo para ser a sua voz e a manifestação da sua vontade, a Igreja, na condição de comunidade messiânica, formada por aqueles que foram configurados ao Cristo por meio dos sacramentos do Batismo e da Crisma, também é chamada a ser canal de expressão e manifestação da voz do Pai. Jesus diz aos apóstolos: “Como o Pai me enviou também eu vos envio” (Jo 20,21).
Dessa forma, o exercício da sinodalidade nos coloca nesse movimento: como o Filho, somos enviados do Pai, para continuarmos a ser manifestação do seu projeto de amor. Somos chamados a tomarmos consciência de que somos essa comunidade de enviados do Pai e, no Filho, o Pai também nos revela a sua vontade para a Igreja, diante dos desafios que o contexto atual impõe para a evangelização. Nossa vocação é sermos fiéis à vontade do Pai como Jesus, que tinha como seu “alimento fazer a vontade do Pai” (Jo 4,34). A prática sinodal é uma forma de estarmos atentos à vontade do Pai, nos abrirmos a ela, sendo-lhe fiéis até o fim, como o Filho o foi, até à morte de cruz.
Além disso, a prática sinodal sempre se dá em um ambiente oracional, porque requer da assembleia uma atenção espiritual para a escuta da voz de Deus. Jesus, antes de grandes momentos, como foi a escolha dos doze apóstolos (Lc 6,12) ou antes da sua entrega às autoridades judaicas para ser crucificado (Lc 22, 39-47), dedicou tempo à oração, para estar nessa união plena com a vontade do Pai. A assembleia sinodal quer ser a expressão do Jesus orante ao Pai, que se coloca em união com Ele, para que se realize não a vontade dos homens, mas a de Deus. E é na oração que Jesus teve o discernimento para agir conforme o desejo do Pai; também a assembleia sinodal, em oração, perscruta e discerne qual a vontade de Deus Pai para determinada situação ou desafio diante do qual a comunidade se encontra.
Jesus nos revela que nós somos os filhos por adoção, sendo Ele por natureza. E, “se somos filhos, somos também herdeiros, tudo isso, por graça de Deus” (Rm 8,17). Assim, podemos entender que a nossa filiação divina também se manifesta e se realiza quando nós nos reunimos em assembleia sinodal. De fato, ao nos reunir para discernir qual a vontade do Pai, nós expressamos que temos a mesma dignidade de filhos por adoção, que, como o Filho, desejam perseguir a vontade do seu Pai que está nos Céus.
A escuta recíproca e o discernimento comum também nos fazem experimentar a nossa comunhão como irmãos. Se temos um Pai comum, somos todos irmãos! A assembleia sinodal não é um aglomerado de pessoas, mas uma reunião de irmãos, que são chamados a voltar-se para o Pai, com espírito filial, pedindo a graça de ser fiel à missão dada pelo Filho. Em vista disso, não faz sentido comparar a prática da sinodalidade com a de um parlamento, na qual se disputa e se negocia para chegar a uma decisão. Não se disputa nem se negocia pela vontade de Deus, apenas se discerne e, como filhos no Filho, cumpre-se essa mesma vontade.
Em vista disso, ser uma Igreja sinodal é expressar a nossa essência de filhos de Deus, colocando-nos todos como irmãos que temos um Pai comum. Que as nossas assembleias sinodais sejam, de fato, momentos em que os irmãos escutem o Pai, que, como tal, deseja o melhor para nós. Deus nunca quer a destruição e a infelicidade do ser humano, pelo contrário, Ele deseja que tenhamos vida em plenitude (Jo 10,10). Escutemos, portanto, a voz de Deus e não a nossa, coloquemo-nos em discernimento da Sua vontade, sabendo que ela é nossa vida e salvação.

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