Dom Murilo S.R. Krieger, scj
Arcebispo de São Salvador da Bahia – Primaz do Brasil
Quem trabalha com pessoas encarceradas vive buscando respostas para perguntas que se renovam: O que fazer para dar alguma perspectiva à vida daqueles que foram julgados, condenados e se encontram em presídios? Como ajudá-los a dar um sentido ao tempo em que passarão isolados da família? Que iniciativas poderiam ser tomadas para que, uma vez libertados, eles possam se reintegrar na sociedade?
A perda da liberdade já é um imenso castigo. Que passos dar para que tal castigo não seja inútil? É sabido que muitos dos encarcerados têm atrás de si uma vida sofrida, uma infância sem alegria e uma juventude sem esperança. Quantos deles tiveram a experiência da vida familiar?
No começo da década de setenta, em São José dos Campos (SP), um advogado chegou à conclusão de que era necessário fazer alguma coisa – e fez: fundou a APAC- Associação de Proteção e Assistência aos Condenados. Lembro-me dos primeiros e tímidos passos que, junto com amigos, esse advogado – Dr. Mário Ottoboni – deu. Naquela época, eu morava em Taubaté e meu trabalho com jovens se estendia por todo o Vale do Paraíba (SP). Jamais eu poderia imaginar que aquela semente de solidariedade pudesse originar uma árvore tão grande e frondosa. A APAC se espalhou pelo território nacional e já foi para o exterior. Há unidades APACs em mais de 20 países, dentre os quais Alemanha, Estados Unidos e Inglaterra.
Qual o segredo dessa iniciativa? A APAC, entidade sem fins lucrativos, dedica-se à recuperação e reintegração social dos condenados a penas privativas da liberdade, bem como a socorrer as vítimas e proteger a sociedade. Ela age como uma entidade auxiliar dos Poderes Judiciário e Executivo, tanto na execução penal como na administração do cumprimento das penas privativas de liberdade. Tendo como lema “Matar o criminoso e salvar o homem”, adota regras disciplinares rigorosas, dando um valor especial à ordem, ao respeito, ao trabalho, à religião e ao envolvimento da família do sentenciado em suas atividades.
A APAC quer humanizar as prisões, sem deixar de lado a finalidade punitiva da pena, e evitar a reincidência no crime. Alguns dados “falam” por si mesmos: normalmente, o custo médio de cada preso para o Estado corresponde a quatro salários mínimos mensais; na APAC esse custo é de um salário mínimo e meio. O índice nacional de pessoas que reincidem nos crimes é de, aproximadamente, 85%; na APAC, esse número fica em torno de 8,7%.
Os voluntários da APAC não são remunerados. A entidade se mantém com doações de pessoas e instituições que acreditam em seu trabalho – trabalho que parte do pressuposto de que todo ser humano é recuperável, desde que receba um tratamento adequado.
Convidado, recentemente, a prefaciar um livro do Dr. Mário Ottoboni – “Testemunho de minha vida e a vida de meus testemunhos” –, escrevi, entre outras considerações, que aquele era “o depoimento de uma pessoa que ficou tocada pela certeza de que o rosto de cada preso é o rosto de Cristo. O resto foi consequência: a fundação da APAC, as lutas para superar os desafios que se foram multiplicando, a preocupação de levar outros a assumir os mesmos ideais etc.”
Por tudo isso, acompanho com alegria uma série de passos que estão sendo dados no Estado da Bahia, para se fundar aqui uma primeira APAC. Na recente visita a Salvador do Sr. Valdeci Ferreira, Presidente da Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados, e do Sr. Durval Andrade, Deputado Estadual por Minas Gerais, uma primeira semente foi lançada. Agora falta a nossa parte – isto é, a união de todos aqueles que acreditam que é possível transformar os encarcerados em cidadãos, “reduzindo a violência fora e dentro dos presídios, diminuindo, consequentemente, a criminalidade”.



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