Em entrevista, pároco da Paróquia São Daniel Comboni fala sobre os 70 anos dos Combonianos no Brasil

Padre Pablo Velazquez – Foto: arquivo da Paróquia São Daniel Comboni

Há 70 anos, o Brasil passava a contar com a preciosa presença dos Missionários Combonianos do Coração de Jesus que, anos mais tarde, também chegariam à Arquidiocese de Salvador, onde permanecem até os dias atuais. Para falar sobre estas sete décadas de missão em terras brasileiras, a equipe do Setor de Comunicação da Arquidiocese de Salvador, em parceria com a Pastoral da Comunicação (Pascom) da Paróquia São Daniel Comboni, entrevistou o padre Pablo Rodrigo Reveles Vazquez, MCCJ. Confira:

Pascom – Padre, como foi a chegada e qual o motivo do envio dos Combonianos para o Brasil?

Padre Pablo Rodrigo Reveles Vazquez – O missionário comboniano, padre Rino Carlesi, em março de 1951, se achava no Rio de Janeiro, vindo de Viseu (Portugal) procurando recursos financeiros junto à colônia portuguesa para a construção daquele seminário em Portugal. Em abril, sondou junto à Nunciatura Apostólica a possibilidade de os combonianos assumirem uma missão no Brasil. O bispo de Caxias, no Maranhão, tinha pedido ao Vaticano a divisão da sua imensa diocese, criando uma prelazia. Também foi pedido um ponto de apoio para os Combonianos na costa, no Espírito Santo. O bispo Dom Luis Scorteganha ofereceu a cidade de Serra – ES. Em dois ou três meses tudo se concretizou. Na região de Balsas – Maranhão foi criada uma prelazia e a paróquia de Serra e Fundão ficaram como ponto de apoio no Espírito Santo.

Em 1952 chegaram à Serra os primeiros missionários e, no começo de dezembro de 1953, chegaram outros combonianos destinados ao Espírito Santo. Em 1955, as irmãs Combonianas chegaram a Nova Venécia para o serviço da paróquia e do jardim de infância. Já em 1956, Conceição da Barra teve o seu primeiro pároco e a fundação do primeiro seminário comboniano em Ibiraçu; no dia da Festa de Nossa Senhora da Saúde, na mesma época, foram erigidas as duas prelazias (futuras dioceses): a do Maranhão e a do Espírito Santo. Em 1958, a Santa Sé erigiu a nova diocese de São Mateus, confiada aos combonianos e José Dalvit foi o primeiro bispo. Um ano depois, os combonianos começaram a construir Igrejas e obras sociais: em Nova Venécia, o Colégio Comboni e as matrizes de Nova Venécia e de São Gabriel da Palha.

Pascom – Como a missão comboniana é desenvolvida?

Padre Pablo Vazquez – Nós combonianos temos algumas prioridades pastorais aqui no Brasil, que fazem parte do nosso carisma missionário.

A Pastoral Indígena: Hoje, nosso empenho pastoral na Amazônia se dá nos centros urbanos de Manaus, Porto Velho e Boa Vista, através da pastoral paroquial, da formação bíblica, de líderes e seminaristas, no acompanhamento de algumas populações ribeirinhas ao longo do rio Madeira e das comunidades indígenas macuxi e wapixana, em Roraima. Também destacamos o empenho comboniano no enfrentamento das violações provocadas pelos empreendimentos minero-siderúrgicos na Amazônia oriental, através da atuação da rede Justiça nos Trilhos ao longo do Corredor de Carajás (comunidades de Piquiá e São Luís – MA).

Trabalhamos em rede com outros organismos eclesiais e movimentos sociais. Destacamos, em particular, a atuação comboniana junto à Vivat International, à Rede Eclesial Panamazônica (REPAM), à Rede Brasileira de Justiça Ambiental e à rede latino-americana Iglesias y Minería.

Afrodescendentes: Herdeiros do carisma missionário de São Daniel Comboni, que dedicou a sua vida para que os povos da África tivessem vida em abundância, os Missionários Combonianos no Brasil têm como uma das prioridades de evangelização os povos afrodescendentes, comprometendo-se com a causa afro.

Direitos humanos e periferia: A presença evangelizadora nas periferias urbanas é uma das prioridades para nós, Missionários Combonianos do Brasil, em sintonia com a Congregação que, desde 2009, assumiu Justiça, Paz e Integridade da Criação (JPIC) como prioridade continental.

Isso é tão verdade que a formação de base dos jovens missionários se dá nas periferias, assumindo um estilo de vida caracterizado pela inserção e sobriedade.

Animação missionária e vocacional: Seguindo os passos de São Daniel Comboni, que dedicou grande parte dos seus esforços para animar a Igreja do seu tempo para a missão na África, buscando colaboradores e recursos para a missão, nós, Missionários Combonianos, nos esforçamos para contagiar a paixão pela missão à todas as pessoas, para que cada um de nós assumamos o protagonismo da missão que nos deixou Jesus Cristo, sendo discípulos-missionários onde estamos e também responsáveis pela missão além-fronteiras da Igreja.

Pascom – Por que Salvador foi escolhida para acolher os missionários combonianos?

Padre Pablo Vazquez – A presença comboniana em Salvador, Bahia, começou em março de 1980 com os padres Franco Vialetto e João Munari assumindo duas paróquias em dois bairros periféricos densamente povoados com cerca de 70 mil habitantes, na maioria afrodescendentes, provenientes do êxodo rural causado pelas situações de precariedade e pobreza dos interiores da Bahia.

Em outubro de 1981, no centenário da morte do fundador Daniel Comboni, foi assinado o primeiro convênio com a Arquidiocese de São Salvador da Bahia, no qual o Instituto dos Combonianos destinaria uma equipe de três sacerdotes, que, juntamente aos compromissos pastorais nas duas paróquias, assumiriam também o “dedicar parte do seu tempo ao estudo das temáticas da vida dos afro-brasileiros” para servir melhor o povo, sendo a maioria negros, e também ajudar os demais Combonianos presentes no Brasil na reflexão de uma pastoral evangelizadora inculturada!

Pascom – Olhando para São Daniel Comboni, quais os ensinamentos que nós podemos tirar?

Padre Pablo Vazquez – Comboni viveu num contexto de exploração e saque do inteiro continente africano por parte das grandes potências européias. Um contexto de colonização, garantido pelo poder das armas e alimentado pela prática da escravatura. Comboni e outros grandes missionários da época, apesar de serem em muitos tratos filhos de seu tempo, entendem o verbo ‘salvar’ na conjugação ao tempo presente. Os Combonianos no Brasil ainda acreditam nesse princípio essencial da missão. Hoje podemos chamá-lo de empoderamento popular, ou, em chave pastoral, de ministerialidade. Em palavras de São Daniel Comboni seria “fazer causa comum” com o povo sofredor.

Pascom – Que mensagem o senhor gostaria de deixar para os missionários e os religiosos que celebram os 70 anos da chegada dos Combonianos no Brasil?

Padre Pablo Vazquez – Simplesmente agradecer a Deus pelo dom do carisma que nos foi deixado através de São Daniel Comboni e ainda mais do que celebrar a nossa presença é o convite de renovar nossa consagração de servir com alegria e dedicação o povo brasileiro, especialmente entre os mais pobres.