Monsenhor Sadoc: 100 anos

Dom Murilo S.R. Krieger, scj

Arcebispo de São Salvador da Bahia e Primaz do Brasil

 

“Aos 13 anos, deixei Santo Amaro, onde tive todos os direitos de viver e sonhar, vivendo o sonho de ser feliz. (…) No seminário fui encontrando novas maneiras de sonhar e acordar para viver. (…) A certa altura, Jesus acenou sorrindo, e também sorrindo o segui. Penetrei no mundo muito sozinho, mas sem medo. Ouvi as palavras do Cristo: Amigo sacerdote, “não fostes vós que me escolhestes, fui eu que vos escolhi, para que vades e produzais frutos e vosso fruto permaneça.”

Essas são palavras de Mons. Gaspar Sadoc da Natividade, proferidas em 1991, quando celebrava 50 anos de sacerdócio. Palavras que ele poderia repetir hoje, no dia do centenário de seu nascimento. Deixo que ele próprio se apresente: “Aprendi diretamente a ciência da dor recolhendo lágrimas, a ciência da vida partilhando esperanças, o segredo de quase tudo, no amor para com todos.”

Mons. Sadoc não só aprendeu a ciência da dor, mas também a ensina ainda hoje, silenciosamente, a todos que o visitam. De nada ele se queixa. Imóvel, em seu leito transformado em altar, ele nos testemunha que o que nos salva não é o sofrimento, mas o amor. O sofrimento nos permite completar em nossa carne o que falta à paixão de Cristo; já o amor “é paciente…, não leva em conta o mal sofrido…, mas fica alegre com a verdade” (Paulo aos Coríntios). A verdade, para este nosso irmão, é envolvida por “misteriosos e delicados processos da Providência. Deus sempre vence porque é amor”.

A Arquidiocese de São Salvador da Bahia, que um dia acolheu este filho de Santo Amaro, alegra-se hoje com a celebração de seu centenário. Nasce espontânea, no coração de todos nós, a alegre necessidade de agradecer. Em depoimentos e entrevistas, Mons. Sadoc reconhece que Deus foi a razão de seus trabalhos e passos. Por Ele vive e por causa dele trabalhou. Nele está a sua esperança. Ao Senhor, pois, toda a glória, pelos séculos dos séculos!

Mons. Sadoc reconhece a infinita distância entre Cristo Sacerdote e ele próprio. Reconhece que não era e não é digno do sacerdócio que recebeu. Mas tem que reconhecer que seu sacerdócio frutificou. Sente, pois, a necessidade de elevar uma prece de agradecimento ao Senhor por todos os que foram beneficiados por seu ministério. Ele sabe que, utilizando-se dos sacerdotes, Cristo passa pelos caminhos dos homens e das mulheres de todos os tempos. Somos testemunhas: Cristo continua passando pelos caminhos de muitos, através do ministério de Mons. Sadoc. Não importa que esse nosso irmão não possa andar: Cristo pode.

Nós nos perguntamos: como agradecer ao Senhor por este presente que nos deu – e já por 100 anos? Nossas palavras são pobres. Nossos gestos são simples. Nossa oração é imperfeita. Ora, nosso Deus é santo; é “o” santo. Alguém já conseguiu agradar a Deus? Sim, há alguém que LHE agradou e LHE agrada plenamente: Jesus, Seu Filho. Por isso, nos unimos a Jesus Cristo e pedimos que ele assuma os 100 anos de vida sacerdotal de Mons. Sadoc e os ofereça ao Pai.

            Em nome da Arquidiocese, e dos milhares de amigos que Mons. Sadoc colecionou ao longo de sua vida, alegro-me em lhe dizer: Obrigado, Mons. Sadoc, muito obrigado! Obrigado por sua presença em nosso meio, por seus longos anos de atividades pastorais em Salvador, por seu testemunho permanente, por suas palavras sábias e, particularmente, por seu bom humor permanente. Deus o recompense! Experimentamos diariamente o quanto de verdade há em seu depoimento: “Nunca me permiti acomodações ou indiferentismo. Na vanguarda da luta, maior é o perigo de sermos atingidos por ferimentos. Pouco importam os ferimentos, os estilhaços ou as cicatrizes; o que importa é lutar. E o fiz!”