O recado do Menino

Yvette Amaral

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É Natal!

Em todos os recantos da terra, famílias se reúnem, grupos se confraternizam, pessoas se abraçam, celebrando o nascimento de um Menino ocorrido na humilde e pequenina cidade de Belém. Ele é um Deus que se fez Pessoa para escrever conosco a história da Nova Aliança, que é a Civilização do Amor. Embora esta Liturgia se repita anualmente, com iguais ritos e símbolos, é sempre novidade que rejuvenesce e oxigena o nosso organismo espiritual. Embora recém-nascido, Ele quer comunicar-se conosco, mandando alguns recados necessários para sermos santos e ajudarmos na santificação do mundo.

Começou dizendo que não está satisfeito com o que encontrou aqui, nessa cidade que tem o seu nome, pois Ele é o único Salvador. Deu uma volta e encontrou muitas crianças e adolescentes perambulando pelas ruas e praças no horário em que deveriam estar numa escola ou numa oficina, preparando-se para a vida e para o trabalho. Nestes menores ociosos, Ele se sente atingido e lamenta termos esquecidos a sua confissão: “Tudo o que fizerdes a um destes pequeninos, é a mim que o fazeis”. Tais palavras são claras e não escondem nenhuma outra intenção, porém revelam a sua identificação com os que estão começando a viver, sobretudo se são simples e pobres. Entretanto não é apenas o sofrimento destes que sensibiliza o coração misericordioso de Jesus. Ele se constrange também com a multidão de adultos e idosos famintos, desabrigados, analfabetos, desempregados, enfim  chutados para os porões da humanidade onde o homem desconhece o que é dignidade, autoestima e participação.

Num mundo criado por um Deus infinitamente bom, misericordioso e justo não pode existir esse cenário de sofrimento e degradação do homem. O Menino reclama que a sua proposta de vida fraterna não foi respondida e não motivou os homens a viverem como irmãos. Irracionalmente, embora inteligentes e livres, eles preferiram a competição à solidariedade, trocaram a partilha pelo individualismo e substituíram o diálogo pela prepotência. E aí está o saldo de tais opções: um mundo desumanizado e fracionado por preconceitos, revoltado com as injustiças, ameaçando  todos com uma espiral de violência que cresce assustadoramente. Como o Menino Jesus lamenta a destruição do seu projeto de justiça e amor! Conforme o seu plano, ele antes de criar o homem, providenciou todas as coisas necessárias para que este fosse feliz, numa sociedade fraterna.

Com toda persuasão do seu olhar infantil e da sua voz de criança, Ele nos pede que urgentemente renovemos a face da terra, implantando nela o Reino do seu Pai para cuja realização Ele pede a nossa ajuda.Não fomos sensíveis a tal convocação e organizamos uma sociedade alheia aos seus referenciais cristãos. Não é possível que tantos filhos seus continuem dormindo nas ruas, procurando comida no meio do lixo, arrastando-se nas longas filas do INSS, envelhecendo sem segurança e morrendo antes da hora. Como justificar tantas desordens sociais, tantos comportamentos condenados pela sua Palavra, tantos esquemas traçados fora dos limites da liberdade e do bem comum!

De que adiantam asconfraternizações natalinas e as cidades vestidas de tantas luzes, se continuamos cegos, perdidos no labirinto da incredulidade e do desamor? Jesus não aplaude os esforços que fazemos para demonstrar-Lhe a nossa fé, se esta não é testada com nossos testemunhos. Não é suficiente o nosso encontro com Ele na contemplação e na adoração.  Ele quer que sigamos a sua caminhada, iniciada na gruta, desenvolvida num cotidiano de serviço a todos, aparentemente concluída numa Cruz, mas que na verdade culminou no esplendor da Ressurreição.