O Senhor ressuscitou

“O Senhor ressuscitou! Aleluia!” Esse é o anúncio que a Igreja faz ao mundo, na Páscoa. Cristãos do mundo inteiro se cumprimentam, alegres: “Feliz Páscoa!” Nas celebrações litúrgicas ecoam, solenes, as palavras do apóstolo Paulo: “Se Cristo não ressuscitou, ilusória é a vossa fé; ainda estais nos vossos pecados… Se temos esperança em Cristo tão somente para esta vida, somos os mais dignos de compaixão de todos os homens. Mas não! Cristo ressuscitou dos mortos!” (1Cor 15,17.19-20a).

Dias antes de receber o prêmio Nobel de Literatura, o escritor francês Albert Camus, interrogado sobre a sua posição diante do cristianismo, respondeu: “Tenho consciência do sagrado, do mistério que há no homem, e não vejo por que não confessar a emoção que sinto diante de Cristo e de sua doutrina. Tenho respeito pela pessoa de Jesus de Nazaré. Não creio, contudo, em sua ressurreição”.

Também hoje encontramos pessoas que admiram Jesus, que têm simpatia por sua mensagem, mas o consideram apenas uma pessoa extraordinária, um ser iluminado, um mestre. Estão muito próximos, nesse ponto, dos ouvintes que o apóstolo Paulo teve em Atenas: eles prestaram muita atenção ao que ele lhes disse; quando, porém, ele começou a falar da ressurreição de Cristo, os que o ouviam riram de suas palavras. Isso não desestimulou Paulo; ao contrário: aonde ia afirmava, com convicção, que a ressurreição de Cristo está no centro do cristianismo; portanto, se deixarmos de lado essa verdade, todo o edifício do cristianismo se desmorona e os ensinamentos de Jesus perdem toda a sua força.

A Páscoa é o acontecimento central da vida da Igreja. Cada domingo somos convidados a revivê-la na alegria. Nossa fé tem como fundamento um Deus vitorioso, mais forte do que o pecado e a morte; mais forte do que nossas limitações e misérias.

Na Páscoa, Cristo ressuscitado passa em nossas vidas  e nos convida a participarmos de sua vitória. Renova sua proposta para que o aceitemos como “Senhor”. Essa festa é marcada pela libertação daquela que é a estrutura que mais nos oprime, e é causadora de todas as outras opressões: o pecado. Qual chaga imensa na vida da humanidade, ele causa desequilíbrios e desencontros.

A Páscoa nos anima e nos fortalece para lutarmos contra o pecado e suas tristes consequências. Cito algumas: o egoísmo que penetrou nas estruturas de nossa sociedade, a banalização do sexo, a busca desenfreada pelo poder, a falta de escrúpulos quando a meta é o enriquecimento (Preciso entrar em pormenores?…), as injustiças institucionalizadas, que geram multidões de pobres, os assassinatos por motivos banais etc. Não podemos ficar indiferentes diante dessa situação: há necessidade da conversão, para sermos coerentes com as propostas daquele que deu a sua vida para que os seres humanos fossem livres.

Uma pessoa ou uma comunidade se convertem e se transformam quando acreditam em Cristo ressuscitado. A humanidade já fez inúmeras tentativas de mudanças, tendo como base ideologias que pregavam valores contrários aos do Evangelho. Viu, contudo, que tais tentativas criaram novas formas de dominação e escravidão. Maior, pois, é a nossa responsabilidade como cristãos. Falharíamos em nossa missão se deixássemos de testemunhar que a vida nesta terra dos homens tem sentido; que o sonho de uma civilização do amor é possível e deve ser alimentado. É necessário, contudo, que passemos pela experiência pascal dos primeiros cristãos. Então, participando da vitória daquele que saiu do sepulcro na manhã da Páscoa, também nós estaremos proclamando com nossas vidas: “O Senhor ressuscitou! Aleluia!”

Dom Murilo S. R. Krieger, scj

Arcebispo de São Salvador da Bahia e Primaz do Brasil