Dom Murilo S.R. Krieger, scj
Arcebispo de São Salvador da Bahia e Primaz do Brasil
Envolvidos, no Brasil, por problemas políticos e econômicos que nos surpreendem a cada dia com novidades e surpresas, somos convidados pela Igreja, neste domingo, a elevar nosso pensamento para o alto. Não se trata de fugir da realidade cotidiana e de nos refugiarmos num mundo seguro. Queremos, sim, olhar para o alto para, então, compreender melhor os desafios que enfrentamos. Essa é a finalidade da solenidade da Santíssima Trindade, celebrada neste domingo.
Normalmente, na Igreja celebramos fatos como, por exemplo, o nascimento de Jesus (Natal), sua ressurreição (Páscoa), a vinda do Espírito Santo (Pentecostes) etc. Na solenidade da Santíssima Trindade não celebramos um fato, mas um mistério.
A palavra “mistério” tem vários sentidos e evoca, no pensamento de muitos, uma realidade oculta, desconcertante ou obscura. No caso da Santíssima Trindade, o sentido é outro: trata-se de uma realidade que a razão humana não consegue penetrar e compreender totalmente, pois ultrapassa a sua capacidade. Não é que Deus não queira nos revelar seus mistérios. Tanto Ele o quer que, primeiramente, nos enviou profetas e homens extraordinários, que nos deixaram palavras belíssimas a Seu respeito (Antigo Testamento); no ponto mais alto da História, ademais nos enviou o Seu Filho (Novo Testamento). A partir da revelação divina, portanto, começamos a penetrar nesse mistério, que é o mais profundo de nossa fé. Apenas “começamos a penetrar nele”, porque, como se trata de uma verdade que é ampla demais para a encerrarmos em alguma definição, acreditamos nela pela autoridade de quem a revelou.
A crença no Deus único em três pessoas (“pessoa” é alguém que tem vida própria e que se relaciona com outras) é a maior novidade do cristianismo. Todas as religiões acreditam em Deus, valorizam os seres humanos, a oração, o jejum, a paz etc. Os pagãos acreditavam em vários deuses; os hebreus, num Deus único; o cristianismo acredita num Deus em três pessoas.
Fique claro: a Trindade é una. Não professamos três deuses, mas um só Deus em três pessoas. Cada uma delas é Deus por inteiro. “Pai”, “Filho”, “Espírito Santo” não são simplesmente nomes que designam modalidades do ser divino, pois são realmente distintos entre si.
Fomos batizados em nome da Trindade (Jesus: “Ide, fazei discípulos e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”). Começamos e terminamos nossas celebrações em seu nome; rezamos ao Pai, por Cristo no Espírito Santo; repetimos, muitas vezes: “Glória ao Pai, ao Filho, ao Espírito Santo”.
Não tenhamos a pretensão de compreender esse mistério. Fomos criados para viver eternamente com a Santíssima Trindade, numa contemplação que será a razão de nossa alegria.



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